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sexta-feira, 20 de março de 2009

saber viver...

Éramos cinco, quatro rapazes e uma rapariga, a mais nova!

Seríamos o que na altura chamavam, uma família “remediada”, nem ricos nem pobres.

Que dos mais velhos as roupas passassem para os mais novos, era uma manobra “normal”.

Acontece que tínhamos uns primos mais velhos e com um estatuto de “desafogados”. Muita coisa deixava de ser usada, em bom estado, aí havia que lhes dar bom uso!

Foi nessa altura, aluno do liceu, que descobri o quanto o nosso corpo é maleável!

Um casaco apetecível já moldado à fisionomia de um corpo maior ou menor, não era impedimento. Uns dias os meus braços encolhiam, outros esticavam, os ombros tornavam-se espadaúdos, outros...franzinos!

Nas camisas de fino corte não havia manga comprida que nos impedisse de usar. Para isso havia uns elásticos estrategicamente colocados nos braços impedindo que as mãos desaparecessem nos punhos.

Os sapatos eram antecipadamente calçados de algodão para que os espaços não fossem vazios, os pés se sentissem envolvidos.

Este poder de improvisação deu-nos recursos e capacidade de fazermos face às contrariedades ao longo da vida!

As meias, esse era o problema!

Havia sapatos que se alimentavam de meias e, dados alguns passos lá desapareciam as ditas, engolidas sofregamente, expondo em nudez os calcanhares. Isso era a única coisa que me aborrecia...

Um dia, estudando o “fenómeno” entendi descobrir a solução!

Munido de uma tesoura, cortei os bicos das meia e, aí sim, cresceu bastante cano na perna...

Não sei se por isso ou pela proximidade dos meus dedos nus no interior do sapato, nunca mais tive os tornozelos à mostra.

Quem não achou piada foi a minha mãe, ao ver as meias naquele estado! Expliquei-lhe e ela, de olhos abertos, incrédula, ouviu-me pacientemente.

No seu rosto vi-lhe um brilhozinho misto de gozo e reprovação.

Disse-me, está bem, mas vê se não usas essas meias um dia que tenhas ginástica, que tenhas de te descalçar... pode ser que fiques surpreendido com os comentários!!!

Ps. Nunca deixei de fazer algo que me interessasse verdadeiramente, integrei-me salutarmente em grupos, apesar da "roupagem"!

AF (Sobral - Biblioteca - Espaço Net - Sapataria)



1 comentário:

  1. sr. Afonso,o seu texto é muito bonito.Antigamente as pessoas eram poupadas,hoje há muita fartura,mesmo aqueles com mais dificuldades, não calçam sapatos que comem meias.


    mariana luis

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