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domingo, 28 de outubro de 2012

Veredas da vida


A Guerra é o maior flagelo ao cima da Terra. Durante anos o volfrâmio foi procurado essencialmente pela indústria da guerra. Hoje há diversos instrumentos do dia a dia que utilizam esse mineral, principalmente ligas fortes e revestimentos resistentes ao desgaste. Portugal possui grandes quantidades deste mineral.
Depois de tantos trabalhos como mecânico, fui trabalhar para as minas de volfrâmio em Bragança, nas minas da Ribeira, onde estive um ano e meio, isto em 1969
Aquilo que vou descrever é como o Volfrâmio é retirado da mina. Não ouvido mas experimentado.
O que mais me custava era no período do Inverno, só via o sol ao Domingo. Antes do nascer do dia, de segunda a sábado, entrávamos na mina ou seja, descíamos o poço com 120 metros, e de lá regressávamos às 17 horas, cansados, enlameados. O almoço cada um levava o seu, conforme podia.
Gasómetro
Botas de borracha, gasómetro no dedo polegar, calças e casaco em oleado, na cabeça o capacete com a lanterna, as baterias às costas, este era o nosso equipamento. Lá no fundo manobrávamos brocas com 2 metros de comprimento. As rochas eram perfuradas, os buracos cheios de pólvora, os cartuchos prontos para a descarga. Às 17h, ao sair da mina contava-se todas as pessoas que trabalhavam no interior não fosse ter ficado alguém no poço. Confirmado o número, só depois se fazia explodir electricamente de uma forma remota as cargas colocadas.
No dia seguinte, ponham-se as bombas de água a trabalhar para regar todo o minério arrancado. Só depois se começava a trabalhar. Todo o material era transportado para o guincho que trazia cá para cima, para os tapetes. Noutro tapete permanentemente com água, várias mulheres com as mãos cheias de trapos, manuseavam com dificuldade o material, escolhendo-o, o frio era intenso.
Depois de moído através de mecanismos de lavagem e secagem e crivos de seleção, sintetizando o processo de apuramento, obtinha-se o produto que fora tão disputado durante a 2ª grande guerra pelos aliados e alemães, o volfrâmio.

Normalmente o valor que muitas pessoas dão aos mineiros, é pouco mais que nenhum, mal pago, arriscado e sujeito a doenças ligadas à actividade. Muitos mineiros contraíram silicose, uma doença afecta à actividade mineira por inalação contínua do pó de sílica. Só quem passou por este trabalho ou teve familiares directos nas minas é que pode dar valor a esta profissão. 
Foi certamente a mais dura profissão ao longo da minha vida!

António Assunção

9 comentários:

  1. Obrigada Sr António pela partilha da sua dura experiência de vida. Sempre ouvi dizer que a profissão de mineiro é muito perigosa e arriscada mas não sabia de que forma funcionava. É de lamentar que as pessoas que ajudam a "sociedade" a enriquecer sejam tão exploradas, mal retribuídas e reconhecidas!
    É a verdadeira "exploração do homem pelo homem".
    Mas ainda bem para si que tudo já passou e que tem os conhecimentos nesta área para nos transmitir, e podermos fazer uma ideia do que é uma vida difícil e dura.
    Obrigada e que Deus lhe dê muitos anos de tranquilidade e lucidez para nos poder continuar a contar experiências de vida. Só assim podemos dar valor ao bem que temos, mas que muitas vezes egoisticamente não nos satisfaz.
    Lourdes Henriques.

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  2. ISTO É UMA HISTÓRIA VERDADEIRA DA VIDA DURA.

    CYNTHIA.

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  3. Conhecia e existência do volfrâmio como um minério valiosíssimo para fazer armamento bélico disputado tanto por alemães como pelos aliados.Desconhecia que para o obter causava tanto sofrimento às pessoas que o extraíam.

    Nativideda

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  4. O António encontrar-se-à imunizado contra os males que o volfrâmio e a sílica poderão causar?...

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  5. obrigado sr António por ser a pessoa que é,e de fazer parte dos nossos amigos, Deus o ajude com muitos anos bons.

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  6. Já conhecia a história do Sr. António, mas é o tormento que passou no fundo das minas, os sacrifícios que fez na vida, que lhe deram sabedoria e fizeram dele um homem de grande valor, sem precisar de diplomas, muitas vezes falsos.

    O Sr. António está um homem activo,faz ginástica, anda na informática, parece ser saudável: é uma prova de como o trabalho não faz mal a ninguém. O Sr. António tem toda a minha consideração.

    Lisete

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  7. Nasci pouco depois do fim da Grande Guerra, e creio que, em 1969, no Minho, já não se "falava" em Volfrâmio. Mas aí uns 10/15 anos antes, o volfrâmio rivalizava, ali, com o Brasil ou com a Argentina (de Perón, lembram-se?). Uns iam para as américas, outros tinham o seu brasil cá dentro...E alguns "enricaram", um familiar meu inclusive, em Trás-os-Montes, em Arouca, na Panasqueira...Eram famosos os "pilhas", não sei se, lá "no fundo da mina", o Sr. Assunção ouviu falar deles: eram aqueles que "encontravam" o volfrâmio - também dito tungsténio - à superfície, já escavado pelos mineiros...

    Nunca tinha ouvido falar da mina da Ribeira: é famoso o tungsténio de Arouca e da Panasqueira, este, pelo menos este, ainda em exploração. Talvez tenha interesse registar aqui que as minas da Panasqueira são as maiores minas subterrâneas do Mundo: são cerca de 12 000 quilómetros de túneis escavados por outros tantos milhares de mineiros como o Sr. Assunção. E para quê? Que riqueza nos tem ficado disso, para além dos ordenados de miséria dos mineiros, da silicose e da agressão ambiental? Eram e são empresas estrangeiras que exploram as minas...As minas? Acompanhei durante anos a actividade "financeira" dessas empresas.

    José Auzendo

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  8. Não conheço o Senhor António, mas não é a primeira vez que nos traz os seus testemunhos, tão importantes, das suas experiências de vida, de trabalho árduo e arriscado. O trabalho mata... teve a sorte de não ter apanhado uma doença grave, como a silicose. Não há muitos anos, um amigo que veio viver no Sobral, em busca de bons ares, acabou por morrer: o seu mal era a silicose, resultado do trabalho de uma vida nas minas de S. Domingos.

    Senhor António, a vida foi-lhe madrasta! Mas pelo que percebo está "rijo que nem um pêro" como costumamos dizer por cá, a sua cabeça felizmente não foi afectada e descreve-nos inteligentemente as suas experiências. Sabe: nós, às vezes, achamos que a nossa vida foi difícil. Mas lendo o que escreve, parece-me que os trabalhos que conseguiu ao longo da sua vida foram de uma dureza que me convida a dizer: Homem valente..

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  9. Ao amigo António, pelo que já nos contou neste blogue, pode bem aplicar-se a frase: “A minha vida dava um filme”.
    Pelo que ouvimos em notícias, vemos na TV ou em filmes, todos sabemos que vida de mineiro não é para qualquer um… Embora pouco tempo deve ter sido uma experiência, com alguns riscos, mas enriquecedora. Palpita-me que ainda tem mais coisas para nos contar…Estou certa?
    Inês

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