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terça-feira, 16 de abril de 2013

RECORDAÇÕES DE INFÂNCIA (CRÓNICAS)

OS TRÊS AMIGOS
Hoje volto a falar em “copos”, um pretexto para que nos voltem a acusar de não termos outro tema para abordar. Advirto que nada me preocupa a opinião dos que a coberto do anonimato me atiram pedras e escondem a mão, numa atitude de absoluta cobardia.
São “aves de arribação” que caíram por aqui, sem quaisquer conhecimentos dos costumes e dos hábitos da nossa gente e da forma como se pode entender o tipo de humor que se cultivava nas nossas aldeias.
Lembro que a acção das minhas histórias decorre em grande parte até meados do século passado, quando a taberna representava o centro social das pequenas localidades, onde designadamente os homens passavam o seu tempo de lazer e desenvolviam as suas formas de convívio, conversando, jogando as cartas e outros jogos lúdicos.
Oferecer um “copo” a um amigo era considerado um dever e era encarado como uma expressão de amizade. E se a taberna era o local de excelência para os “bêbados”, também por lá permaneciam alguns homens que não consumiam álcool.
Não se estranha, portanto, que muitas das histórias que se contavam tivessem origem na taberna e que envolvessem “copos”.
Não temos qualquer admiração por “bêbados” e lamentamos o drama de todos quantos enveredam pelo caminho do álcool, era uma prática muito frequente e que infelizmente ainda hoje se faz sentir.
Previno que não estou disponível para entrar em polémicas sobre este ou quaisquer outros temas e prometo que não falarei em “copos” nos tempos mais próximos.
Após estas breves notas, vamos à nossa crónica de hoje.  

Nos anos quarenta do século passado, num tempo de alguma acalmia entre a II Guerra Mundial e a Guerra Colonial em África, a grande maioria dos jovens, designadamente das regiões centro e sul do nosso País cumpriam o serviço militar obrigatório em Lisboa, nos muitos quartéis que se localizavam na Capital.
Num desses quartéis durante uma recruta, estabeleceram uma relação de amizade e de camaradagem três jovens, um originário aqui da região “saloia” e os outros dois, vindos algures do Ribatejo.

Aos fins de semana, sempre que não estavam de serviço e se havia dinheiro para a viagem, iam passar o domingo à Terra, apanhando a “carreira”, o autocarro de transporte público,
que servia as suas localidades, na Rua da Palma, na Garagem Lys ou na Garagem Navarro, conforme o caso. Nesse tempo não havia terminais rodoviários.
Garagem Liz na Rua da Palma
Antes de “embarcar”, passavam invariavelmente por uma das muitas tabernas que havia no local, para beber um “copo”, uma das formas de convívio muito usual na época.
Esta prática decorreu durante todo o tempo que estiveram na “tropa”. Findo o cumprimento de serviço militar, dois dos amigos voltaram às suas aldeias, enquanto que o “nosso conterrâneo” continuou em Lisboa, agora a trabalhar nas “obras”, mas fazendo semanalmente o mesmo trajecto que fazia anteriormente.
Contudo, não deixou de ir à taberna do costume, onde o taberneiro sabendo o seu hábito lhe aviava três “copinhos”, que ele bebia com grande satisfação, um à sua saúde e os outros à saúde dos seus amigos.
Porém, certo dia, interpolou o homem da taberna, dizendo que naquele dia, só queria que lhe aviasse  dois “copinhos”.
Aquele com um ar apreensivo perguntou:
Não me diga que morreu algum dos seus amigos?
Ao que ele respondeu de pronto.
NÃO SENHOR, FELIZMENTE QUE NÃO, FUI EU QUE DEIXEI DE BEBER.

Eduardo João

2 comentários:

  1. Mais uma das muitas histórias que o Dr. Eduardo João ouviu contar aos mais antigos e que nos traz, para que não se percam no tempo.
    Gostei da maneira como narrou a história e gostei sobretudo da personagem um homem de convicções,um homem que se tornou abstémio, mas que não queria esquecer os amigos, e assim bebia por eles, e com que sacrifício o devia ter feito...calculo.
    Maria Alexandrina

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  2. Mais uma história engraçada e diferente, retirada do "livro de recordações" do Dr. Eduardo João.
    Uma maneira muito peculiar de demonstrar amizade pelos amigos...
    Outros tempos, outras hábitos, mas não é por isso que as amizades não seriam mais sinceras.
    Obrigada Dr. por nos contar mais uma das suas Recordações de Infância. Só assim elas poderão sobreviver e não serem esquecidas.
    Lourdes Henriques.

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