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domingo, 2 de setembro de 2012

Frases célebres... Filosofia e grandes pensadores


A História de um País faz-se sobretudo pelos feitos gloriosos e heroicos do seu povo. A História de uma povoação, seja ela aldeia, vila ou cidade é construída pelo valor dos seus habitantes, que a desenvolvem mediante as suas possibilidades e a sua vontade de a ver crescer. Mas, nem só de História vivem as populações, vivem também de “histórias"…Quanto mais pequeno é o burgo, mais histórias são do conhecimento público.
Recordo que no Sobral de Monte Agraço de há 60 anos havia muitas mais histórias, contadas, do que hoje. Os audiovisuais, a maior possibilidade de as pessoas se deslocarem, vivendo em constante movimento, fazendo do dia a dia um constante rodopiar, acabaram definitivamente com os serões nas casas dos vizinhos, onde além de se fazerem o crochet e o tricot, se conversava e se contavam histórias. Histórias reais de pessoas reais, e havia aquelas personagens que, por serem diferentes na sua maneira de estar na sociedade, se tornavam mais notadas e, assim, mais susceptíveis de nos lembrarmos delas. Os filósofos e os grandes pensadores deixaram para as gerações futuras grandes frases, que nunca deixaram de ser repetidas, ao longo dos séculos. No Sobral não havia filósofos, mas recordo três homens que, durante a minha infância e adolescência, tinham uma filosofia de vida diferente do quotidiano, e empregavam sistematicamente as mesmas frases, que os Sobralenses repetiam, na certeza de que elas pertenciam, por direito próprio, a quem as usava.
O senhor Alfredo Mota era sapateiro na firma do Sr. Armindo Diniz, não sei quantos anos viveu no Sobral, dizia-se que tinha um filho, mas nunca lhe conheci família. Era um homem muito alto, esguio, a sua figura para mim (criança) era um pouco sinistra. Era trabalhador, introvertido e sem amizades. Numa greve de trabalhadores, que julgo ter sido no final da década de 50, quatro pessoas tiveram a coragem de se sentarem na Praça, mostrando estar de greve. Um deles era o meu padrinho e outro o Sr. Alfredo Mota. E ali ficaram, conversando, fazendo o seu dia de greve, tão calmamente que os situacionistas nem se aperceberam de que aquelas quatro almas tinham passado ali o dia como grevistas. Introvertido e calmo, esporadicamente o sr. Alfredo saía da “toca”, e quando o fazia era de “caixão à cova”, apanhava a sua piela e, assim, era vê-lo num banco da Praça Dr. Eugénio Dias, falando e gesticulando, enfiando os seus lábios para dentro da sua boca desdentada, durante algumas horas. Nunca percebi o que dizia, mas se alguém o abordasse, a resposta era só uma: “ Quem vai, vai...quem está, está”...
Depois o Mestre Zé, assim era conhecido. Julgo que era ribatejano, ferrador de profissão, trabalhava na oficina do Sr. Mário Lopes (Mário Ferrador); era um aficionado, adorava touradas. Nas pamplonas era vê-lo sempre atrás dos touros, julgo que até teve que ir para o hospital, depois de umas benditas marradas. O seu traje era sempre o mesmo: uma camisola interior, calça de ganga, (da época) e um lenço de assoar vermelho atado ao pescoço. Este, ao contrário do Sr. Alfredo Mota, era muito comunicativo e rematava todas as conversas com uma sonora gargalhada, mostrando a sua fileira de dente sim dente não…dizendo:” É festa...é festa”.
Por último o Senhor Joaquim Marcelino. Passava o dia a dia a trabalhar na forja da sua cutelaria, isolava-se de tudo e de todos; era um chefe de uma família exemplar, muito trabalhador. Mas, de longe a longe, vinha à taberna e, então, transformava-se completamente. Com um “grãozinho na asa” fazia grande alarido, em discursos directos e indirectos, abordava as pessoas, borrifando-as de gafanhotos; com grandes abraços e grande conversa, ia repetindo várias vezes durante o seu discurso: “Sim é que eu sou... o segundo Marquês de Pombal”.
Nenhum deles nasceu no Sobral, mas fizeram desta vila a sua terra, e nós sobralenses aceitámo-los como conterrâneos e respeitávamo-los; e se aqui os recordo, é com o maior respeito que o faço: eles eram homens simples, trabalhadores e honestos, que foram- se integrarando na sociedade. Apenas tinham uma vida atípica, ligeiramente diferente da restante população. Tiveram em comum, entre eles, terem vivido e morrido em Sobral de Monte Agraço.
Maria Alexandrina

5 comentários:

  1. Olá amiga Alexandrina
    Também eu não sou de cá mas esta terra é-me particularmente querida de há mais de umas 4 décadas. Habituei-me a frequentá-la por arrastamento, e adoptei-a definitivamente há perto de uns 10 anos. Desta forma não conheço muitas "histórias da vida real" dos Sobralenses. Mas conheci perfeitamente o senhor Marcelino, que até há bem pouco tempo ainda se encontrava no meio de nós. Conheci-o já numa fase muito avançada da sua vida, mas foi uma pessoa com quem eu gostava de conversar. Desconhecia de todo esta sua faceta de "lider - Marquês de Pombal". Achei imensa piada. Acho que é sempre agradável e surpreendente sabermos passagens engraçadas que marcaram pessoas que conhecemos mas com quem nunca convivemos no dia a dia, e por isso mesmo não as conhecemos bem.
    Os outros dois senhores tenho ouvido na realidade falar deles, mas não me recordo de os ter conhecido. De qualquer forma, foram pessoas que contribuiram para enriquecer, ainda que de uma forma minima e graciosa, as "histórias de vida" da História do Sobral. Sim, porque a História não se compõe apenas de factos heróicos, patrióticos e assuntos sérios. Muito mais do que isso, existe a característica das suas gentes, do seu povo, e todo este conjunto é que forma a VERDADEIRA HISTÓRIA.
    Obrigada e continue a brindar-nos com estas histórias de vida real.
    Um beijinho da amiga
    Lourdes.

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  2. D.Maria Alexandina
    Como «colega» de postagens e leitora habitual dos vossos textos aqui estou eu mais uma vez a prestar homenagem á «literata» que se tornou impressível,certo?
    Gosto de ler o que escreve e de saber as vossas fiolosofias,é mais um tempo preenchido.
    Obrigada
    Um abraço
    Luisa

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  3. Amiga Lourdes agradeço as suas amáveis palavras e a sua simpatia, eu não faço mais do que lembrar o passado, tentando que não fique esquecido após o desaparecimento de quem tem lembranças. É-me muito grato falar de pessoas e monumentos que desde sempre conheci. E como amo muito esta terra, que não é minha, mas que me acolheu desde dos meus 2 anos de idade. Costumo dizer que sou Sobralense de alma e coração,mas emprestada...
    D.Lourdes quero esclarecê-la de que este Senhor Marcelino a que me refiro no texto, era pai desse outro que a Senhora conheceu. A Senhora conheceu o Alfredo o pai era o Joaquim.
    Um beijinho
    Maria Alexandrina

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  4. “As frases…” da D. Alexandrina remetem-me mais uma vez para a minha adolescência no Minho. Também lá tínhamos alguns autores de frases desse género, a quem chamávamos de “castiços”. Curioso é que “castiço” quer dizer puro, de boa casta; mas não era este o sentido que dávamos à palavra. Era antes um sentido algo depreciativo, mais próximo de ingénuo, não muito inteligente, não com o “juízo” todo.

    Lembro-me de que a televisão, aí por 1960, veio alterar isto tudo: as frases que passaram a repetir-se deixaram de ser as dos nossos “castiços”, para serem ditos que actores propagavam. Uma destas, que perdurou, era, salvo erro, "cá o Rogério é que sabe”: durante meses, toda a gente terminava uma conversa apelidando-se de Rogério!...Era triste. Depois vieram outras...

    E assim, lá pelo menos, “morreram” também os poetas populares que, antes, enfileiravam entre os mais citados “castiços”. Num texto anterior (espero que toda a gente se lembre ainda bem!...) a D. Alexandrina citou um poeta popular do Sobral. Sei que poemas “em louvor do Sobral” há-os às carradas, alguns até em livro. Poemas neste blogue também não têm faltado!... Mas desses poetas populares que falam rimando, num café como num funeral, cadê eles? Alguém se lembra? Existe algum ainda?

    José Auzendo

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  5. Que inveja da tua memória.
    Ao recordares aqui estas figuras bizarras fizeste-me recuar
    à minha infância e adolescencia pois recordei e reconheci todas.
    Um deles até era meu vizinho mesmo na porta ao lado e tantas vezes o ouvi cantar quando já estava com um copito a mais o que acontecia com muita frequência. Gostei muito.
    Quem vai vai...Quem está está. Era como quem diz não se metam na minha vida. Manuela

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