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sexta-feira, 3 de agosto de 2012

PERCURSO DE VIDA MUSICAL (4ª. parte)


Duo (Em casa Out. 1971)
Depois de casados, ambos afastados do “palco”, começámos a praticar em conjunto algumas músicas. Como grande músico que era na altura, conseguia fazer acompanhamentos especiais para me acompanhar, e chegámos a tocar em duo músicas bastante difíceis e trabalhosas. Mas apenas em casa, apenas para satisfazer a nossa paixão comum: a música. Mas a pouco e pouco ele foi esquecendo o acordeão na caixa até que deixou mesmo de tocar. Por meu lado nunca desisti e não raras vezes treinava. Até que após sete anos de abandono da música, um belo dia o Renato, assim se chama o meu marido, resolveu vender o acordeão uma vez que fechado se estava a deteriorar. E eu, impulsiva como sou, opus-me violentamente declarando:
- Só depois de passares por cima do meu cadáver!
Foi como se tivesse tido um choque eléctrico com a minha reacção inesperada. E achou tanta piada que logo desistiu da ideia. Pouco tempo depois, incentivado pelo meu entusiasmo, voltou a retomar os treinos, a recuperar algumas músicas há muito esquecidas e a aprender outras que se pudessem adequar ao duo.
Entretanto, também a nossa filha mais nova, de quatro irmãos, despertava para a música e aos 7 anos começou a sua aprendizagem. Passados 5 anos também ela já se destacava pela sua grande sensibilidade e habilidade que herdara do pai. E por vezes o duo transformava-se em trio, o que recordo com muita saudade…
Natal 1988 ( Marina, 12 anos)
Voltando agora um pouco atrás, em Julho de 1988, um grande amigo que o Renato tinha deixado na Carvoeira 30 anos antes, tendo sabido por portas e travessas que a filha, apenas com 12 anos naquela época, tocava muito bem, procurou-o no trabalho para lhe fazer uma proposta: convidar o casal e a filha para tocarem na Carvoeira, durante 3 noites do Carnaval de 1989. Tínhamos à nossa frente quase 7 meses para treinar convenientemente e preparar-nos. Claro está que de imediato, o meu marido não aceitou, mas teve o “azar” de me contar, e aí, a conversa já foi outra. É que eu não desisto à primeira, e rejeitar uma oportunidade com que sonhava só por receio de já não brilhar como antigamente, não aceitei a derrota.
Lutei, fui persistente, fiz-lhe ver que estava a negar à filha o direito de brilhar e não seguir a sua vocação de maneira a que mais tarde ela própria pudesse escolher o seu caminho, tal como o meu pai me fizera. Aliás, ele próprio foi “vítima” da vontade férrea do pai que, tendo sido alertado pelos professores para deixar o filho estudar porque era muito inteligente, negou-lhe esse direito, não por falta de dinheiro mas porque ele entendia que era assim. Entendi que as histórias não se podiam ir repetindo hereditariamente e alguém tinha que travar o “quero, posso e mando”. E como sempre, lá entrou a parte do meu “mau feitio” em acção. Mas em boa hora o fiz … acabou por me perceber e concordar comigo. E lá começámos de novo a readquirir a aprendizagem das músicas já esquecidas (por ele). Eu nunca abandonei de vez o meu “amigo acordeão”, apesar de ter pouco tempo. 

 Lourdes Henriques

10 comentários:

  1. Amiga Lourdes desconhecia essa sua faceta de "mau feitio". Eu digo "mulher de garra", assim é que é!
    Esse seu amor pela música é lindo de morrer...
    Um abraço, cá de longe.
    Maria Alexandrina

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  2. Olá Milú
    Como sempre encanta-me a sua descrição.Uma historia verdadeira que prende o leitor do principio ao fim.
    Gostei...e aplaudo...parabéns
    Um beijo
    Luisa

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  3. parabéns vizinha amiga,mulher de garra,só assim se consegue alguma coisa na vida.Tenho pena de não ter sido assim. beij
    lisete

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  4. Carlos Alberto Morais dos Santos3 de agosto de 2012 às 22:01

    Sempre ouvi dizer, que ao lado de um grande homem está sempre uma grande mulher, e aqui está mais um exemplo que deveria ser seguido por muitas outras.. Bem haja.

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  5. O "mau feitio" és tu quem assim pensa, talvez um pouco de teimosia, por vezes,talvez muita perserverança...
    Antes isso, a desistir de todos os sonhos....

    Beijinhos

    Filho Velho

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  6. Reconheço que não é simpático da minha parte pôr-me a glosar, a "criticar", um comentário feito por outrem. Comentário aliás que, inteligentemente, adaptou o aforismo que diz que "por trás" de um grande homem está sempre uma grande mulher...Porquê não dizer que por trás de uma grande mulher está sempre um grande homem?

    Camões disse que um fraco rei faz fraca a forte gente. Esta "etapa" da D. Lourdes mostra que Camões e os aforismos estão, ou podem estar, errados: um "fraco rei" - o marido a querer dsistir, a querer arrumar as botas - não foi suficiente para a fazer recuar, para fazer fraca a colectiva decisão final.

    Nem uma fraca prole, como se vê também.

    José Auzendo

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  7. Esse "mau feitio" que impulsiona a coragem de lutar pelo que se quer, é quanto a mim, o que distingue os vencedores dos vencidos. Mesmo que no final o resultado não seja o esperado. Mas parece que até nem foi o caso. Talvez porque os desejos da "rainha" fossem mais fortes que os do "fraco rei".

    Beijinhos,
    Marina

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  8. "O Rio corta a rocha não por causa da sua força, mas por causa da sua persistência"

    Beijinhos da amiga


    M.R.F.

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  9. Uma vida muito interessante e muito bem contada.
    Parabéns
    Adelaide

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  10. De tanto que já foi dito, posso apenas acrescentar que estas vivências fizeram de nós pessoas mais dispertas para a música... Talvez por ser "calona" ou "qui ça" por falta de melhores oportunidades, passei ao lado destes momentos em trio familiar que, observados de fora no olhar pelo olhar de uma criança, me faziam sonhar....
    Mas apesar de não ter seguido os "ensinamentos musicais", ficou a estrutura e firmeza de um "mau feitio" que sempre levou para a frente o seu castelo....

    Bjks
    Filha Rabina

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