VISITANTES

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Os Jogos Olímpicos

Num ou noutro ponto deste Blogue, já foi referida a longa, difícil e universal luta da Mulher (das mulheres!...), para que os seus direitos fossem reconhecidos em plano de igualdade com os homens. Estão a decorrer os Jogos Olímpicos e, este ano, a 30ª olimpíada de Londres é considerada histórica porque, pela primeira vez, todas as delegações dos 214 países participantes incluem mulheres…Parece que no caso da Arábia Saudita só uma mulher e toda de negro tapada, mas uma mulher mesmo assim. Vamos dar umas voltas, após o que regressaremos aqui, como a pescadinha…
Por altura dos Jogos Olímpicos é frequente falar-se no espírito olímpico, na sua história, a antiga e a moderna. Não vou alongar-me nestes aspectos, referirei apenas o necessário para enquadrar o texto no seu contexto. Embora Homero situe o início dos Jogos em 1370 antes de Cristo, eles terão começado de facto por volta do ano 800 a.C., na cidade de Olímpia, em honra de Zeus, o principal deus da Grécia Antiga. Foram proibidos 1 200 anos depois (cerca do ano 400 d.C.) pelo Imperador romano Teodósio, que os considerou um culto pagão, por influência de Santo Ambrósio, então bispo de Milão… E ficaram “esquecidos” durante quase 1400 anos!...
Em 1796, na França revolucionária, começou a organizar-se, anualmente, o que se chamouL’Olympiade de la Republique. E, a partir de 1850, diversas cidades europeias começaram a organizar competições desportivas internacionais, visando o renascimento do espírito de Olímpia. Mas só em 1894, um aristocrata francês, Pierre de Fredy, mais conhecido como Barão de Coubertin ou Pierre de Coubertin, lança a ideia de institucionalizar a realização dos Jogos de forma regular, criando para o efeito o Comité Olímpico Internacional, o COI, que ainda hoje se mantém. Pretende que os “seus” primeiros Jogos se realizem em Paris, mas cede ao simbolismo da ideia e aceita que tenham lugar em Atenas, em Abril de 1896, com a presença de 285 atletas em representação de 13 países e 9 modalidades desportivas.
Nascem por esta altura, além dos cinco círculos unidos representando os cinco continentes, as três ideias que foram consideradas as bases do moderno espírito olímpico: 1.Citius, Altius, Fortis” (mais rápido, mais alto, mais forte); 2. o amadorismo; 3. o importante não é vencer, mas participar e competir com dignidade…Como sabemos, destas três ideias…só a primeira se mantém, na prática. Hoje o importante é vencer, mesmo que com “dopping”… e outros estratagemas.
Francisco Lázaro
E quanto ao amadorismo…nem vale a pena falar. Entendamo-nos, todavia, sobre o que, para Pierre de Coubertin, era “amadorismo olímpico”: aristocrata de muitas gerações, só deviam competir nos Jogos aqueles que, para viver, treinar e competir, não precisassem de dinheiro de outra fonte que não os rendimentos familiares…Eram Jogos para os nobres e aristocratas... em 1912, na Olimpíada, em Estocolmo, foram admitidos atletas com outra fonte de rendimentos, com uma profissão: foi o caso do nosso Francisco Lázaro (carpinteiro), o primeiro atleta a morrer durante uma prova olímpica. Fez 100 anos, e foi também a primeira participação portuguesa nos Jogos.
Mas ainda em 1932, e já com 9 medalhas de ouro e 3 de prata em olimpíadas anteriores, o finlandês Paavo Nurmi foi impedido de participar nos Jogos de Los Angeles, por ter recebido dinheiro para a viagem numa corrida antes realizada na Finlândia. E ficou a ver os jogos nas bancadas do estádio de L.A.
Mas o que mais surpreende, ou talvez não, no pensamento de Pierre de Coubertin é a sua posição quanto às mulheres…É célebre a sua frase acerca da participação do género feminino nos Jogos: a integração de mulheres seriaimpraticável, desinteressante, inestética, incorrecta. E, assim, em 1896, em Atenas, as mulheres foram completamente banidas. Reza a história que uma grega (Stamata Revithi) fez a Maratona clandestinamente atrás dos homens, tendo completado a prova em 5,30 horas…
Dália Cunha
Só em Londres, em 1908, começaram a ser admitidas mulheres e, mesmo assim, só em algumas modalidades: golf, ténis, hipismo… Consta que, antes, uma ou outra mulher tinha participado como cavaleira…de cavalos inscritos, sem que os nomes delas constassem das fichas de inscrição. A primeira delegação portuguesa a integrar mulheres foi a de 1952, em HelsínquiaUma dessas ginastas, Dália Cunha, curiosamente ainda vive em Torres Vedras. Diz-se, pelo menos está escrito, que uma chefe da Mocidade Portuguesa lhe disse, nessa altura, que a ginástica não era “própria” para meninas, porque “a espargata podia desvirginar as raparigas”…
E assim demos a volta à pescadinha: é algo como isto que hoje devem pensar os sauditas – se as suas mulheres não andarem todas tapadas … Pobre Pierre de Coubertin: gastou toda a fortuna a financiar os Jogos e morreu pobre, só, fulminado por um ataque cardíaco, em plena rua de Genebra, onde foi sepultado. Menos o coração, que foi trasladado para Olímpia, onde permanece num mausoléu em sua honra.




José Auzendo

5 comentários:

  1. O professor Auzendo, como sempre, em cima do acontecimento. Este é o acontecimento mais importante do ano, a nível desportivo.

    Desde que em Portugal se começou a dar algum relevo aos Jogos Olímpicos, fui sempre uma entusiasta apreciadora. Mas, desde do meu tempo até agora, sofreram-se grandes transformações. Onde está o amadorismo? Hoje vale tudo, salvo algumas exepções, para que se ganhe uma medalha. Os atletas na sua maior parte ganham balúrdios nos seus Países ou fora deles, e depois competem num evento de amadorismo.

    Os atletas portugueses vão competir tendo à partida a noção das diferenças, por que somos pequenos e, ainda e o mais grave, porque somos pobres.
    Mas estes Jogos Olímpicos foram marcados por uma abertura de alguns países,que abriram uma pequena fenda nas suas mentalidades e integraram mulheres nas suas delegações. É certo que vi mulheres a correrem de calças e burca...que vi uma judoca de 16 anos de cabeça tapada.,. mas foram mulheres que vi, a competirem... Com esta pequena fenda no sistema, talvez que, a pouco e pouco, elas ganhem coragem para dizerem não...

    ResponderEliminar
  2. Ás vezes tambêm me apetece "meter" a colhetada...mas sinto-me tão pequenina...só digo que estou feliz,cheguei ao século XX1,desde que nasci até agora muita coisa melhorou...vão-se abrindo fendas benéficas e a nivel dos Olimpicos,lendo a postagem do Prof.Auzendo estamos no bom caminho,tendo que caminhar sempre...
    seja qual for a vertente.
    Obrigada Prof. pelo que aprendi, outras reaprendi .

    Um abraço

    ResponderEliminar
  3. Obrigado. Gostei do que li e aprendi
    Adelaide

    ResponderEliminar
  4. Olá Professor Auzendo
    Mais um dos seus textos valiosos que nos pretende transmitir o que se passa a nível mundial, no desporto.
    Na realidade, por negligência ou por característica de personalidade, nunca fui grande entusiasta dos desportos. Reconheço que é uma atitude muito errada da minha parte, mas desde jovem que sempre fui assim. Talvez mesmo por isso tenha algumas maleitas que poderiam ter sido evitadas se praticasse algum desporto. Mas ... gosto de saber.
    Obrigada pelo seu texto explicativo e esclarecedor àcerca da origem e evolução dos Jogos Ilímpicos. Bem-haja pelo esforço que dispende em favor dos outros, para lhes tentar despertar o interesse por assuntos que muitas vezes até nos passam despercebidos.
    Um abraço
    Lourdes.

    ResponderEliminar
  5. Os Jogos Olímpicos, abstendo-nos de todos os quiproquós, são, quer gostemos mais ou menos de desporto, um acontecimento a que ninguém fica indiferente, “rezando” para que um português consiga subir ao podium.

    Mas as medalhas são, para nós, cada vez mais uma miragem. Sim, D. Alexandrina, somos pequenos e pobres, mas somos acima de tudo muito mais pobres em espírito - este ano, num país que se está a afundar, só mesmo “a remos” conseguimos a medalha - até parece ironia.

    Todos sabemos que o desporto deve ser incentivado nas escolas, contribuindo para o desenvolvimento global do aluno, com benefícios para a formação da sua personalidade; no entanto, o nosso Governo prepara-se para desvalorizar a Educação Física e outras disciplinas ligadas à creatividade.

    Não resisto a transcrever um parágrafo de um artigo do Dr. Daniel Sampaio ”Tudo quieto na escola!” no Jornal Público de 5.8
    “O Governo, que está sempre a louvar as virtudes das classificações nos exames, prepara-se para desprezar a avaliação em EF. A justificação só pode ser o novo lema da tutela: tudo quieto na escola! Se forem gordos, receosos ou agressivos, basta fazerem mais exercícios em papel… sentados, claro!”
    Tá tudo dito.
    Inês

    ResponderEliminar