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sexta-feira, 3 de maio de 2013

Uma experiência intrigante


Venho hoje relatar uma experiência pessoal, que me aconteceu no dia 18 de Março. Não está clinicamente explicada, e pode acontecer que alguém conheça algo de semelhante e o queira divulgar. Para melhor compreensão do leitor, vou antecipar alguns factos.

1.Sigo este blogue, pelo que todos os dias de manhã lhe faço uma visita, para ver as novidades. No dia dessa “experiência”, uma segunda-feira, havia um artigo novo sobre o dia do pai, que eu li. 2. Estávamos nas vésperas do Dia Mundial da Poesia, e, durante o fim-de-semana anterior, eu tinha estado a decorar um poema para ler na “Festa” que ia realizar-se: não sabia o poema de cor, mas já me bastava ler o início das estrofes para as dizer sem olhar para o texto. 3. Tinha um mail importante para escrever, e de vez em quando lembrava-me de ideias que devia incluir nesse mail. 4. Uma notícia saída uns dias antes no Blogue mostrou-me que, até esse momento, eu estava convencido, erradamente, de que Moitelas fazia parte do concelho de Torres.

Nesse dia 18, pouco depois de ver o Blogue, fui a Torres para uma consulta de rotina. A consulta foi às 11 e decorreu normalmente. A seguir fiz um electro cardiograma. Regressei ao parque de estacionamento subterrâneo, paguei, arranquei e saí com toda a normalidade de regresso ao Sobral.

Aí um quilómetro depois de sair do parque, veio-me à memória uma cena que eu “tinha presenciado” momentos antes. Já não recordo que cena foi: vamos por isso supor agora que, na rua a seguir ao parque de estacionamento, eu tinha visto uma pessoa a chorar…E então imagem dessa pessoa a chorar veio-me à memória, e pensei:
“que estranho estar ali uma pessoa sozinha a chorar na esquina”… Mas de repente perguntei-me: “quando é que eu vi uma pessoa a chorar na rua?” Não, de facto, não tinha visto ninguém a chorar na rua. E também não me lembrava de ter sonhado com isso. Estranhei que me tivesse vindo à mente aquela “recordação” que não o era, mas procurei esquecer.

Só que uns metros à frente, nova “recordação” me surgiu, clara, na minha mente. Raciocinando depois, também desta vez nada eu tinha vivido, nem sonhado, que justificasse essa nova “recordação”. E isto foi-me acontecendo, foi-se repetindo, umas cinco ou seis vezes: sempre “recordações” diferentes de situações que, afinal, me eram estranhas. A última dessas “recordações” levou-me a que eu me perguntasse: mas afinal quantos são hoje? Não consegui lembrar-me em que dia estávamos, mas tal não me pareceu grave, pois é frequente eu não me lembrar disso. Mas eu achei que devia tentar descobrir em que dia estávamos e perguntei-me: em que mês estamos? Não sabia. Raciocinei, falando sozinho, em Janeiro não estamos, pois o Natal já foi há muito. Julho, Agosto não é … pois há nuvens, está escuro, não está tempo de Verão. Mas não fui capaz de dizer um nome para o mês em que estávamos.

Fiz um esforço, tentando raciocinar, para tentar “chegar” ao mês em que estava … Nas tentativas que fiz… dando voltas à cabeça, não fui capaz de recordar um único texto saído no Blogue nos últimos tempos…nem sequer meu, embora me lembrasse de ter estado em casa a ler o Blogue três horas antes.. Recordei que tinha andado a estudar um poema. Que poema era? Nem o nome, nem uma única palavra do poema consegui recordar. E nem fazia a menor ideia…do que pretendia fazer com o poema. Bem me perguntava: para que é que eu andei a estudar o
poema? Não fui capaz de responder. Lembrei-me de que havia um mail que tinha de escrever. Sabia para quem era, mas sobre o que era o mail? Qual o tema? Nada, nenhuma ideia…Porque é que eu tenho que escrever a Fulano, perguntava-me. Não sabia. Aí fiquei preocupado e procurei ver se estava no caminho certo … Estava: vinha de Torres, da consulta, fiz o electro cardiograma, estava a passar em Dois Portos, ia para o Sobral e os carros em sentido contrário não buzinavam … sinal de que eu estava a conduzir bem. E com as mãos bem agarradas ao volante…Não em pânico, mas assustado.

Ao ver a placa indicativa de Mouguelas, povoação de Torres já perto do Sobral, descobri: já sei porque é que eu pensava que Moitelas era de Torres: confundia Moitelas com Mouguelas. E logo de imediato recordei mais: o texto do blogue é sobre o dia do pai, hoje é o “dia do pai”. E o poema que eu estudei é para o “dia da poesia”… Foi tudo o que consegui recordar. Chegado a casa corri para o computador: afinal era a véspera do Dia do Pai; vi que o poema, de cujo nome então me lembrei, era para o Dia Mundial da Poesia; e veio-me à memória, lembrei-me, do tema do mail que tinha que escrever… Peguei no texto do poema e li-o. Li-o nesse momento como o lia nos dias anteriores…

O médico, que fui consultar de imediato, achou muito estranha a experiência e admitiu que poderia ter uma de várias causas, nenhuma delas agradável (mas a TAC feita não revela anomalias …). E depois tudo voltou ao normal, nunca mais tive até hoje qualquer situação parecida (estou a escrever no dia 2 de Maio). Mas naquele dia, durante cerca de 20 minutos, uma infinidade de coisas varreu-se-me por completo da memória. E nunca mais soube descrever as tais “recordações” com que tudo começou: vi logo isso, em casa, quando contei a “experiência” à minha mulher. Nem faço ideia de onde surgiram as “recordações” das cenas que, afinal, não tinha visto, nem vivido, nem sonhado.

Costumamos dizer, e é verdade, que a nossa mente é algo de fabuloso e tem uma capacidade que frequentemente nos surpreende. Mas também nos pode mostrar quão frágil é o tecido de que somos feitos, e como por vezes nos sentimos impotentes perante situações que não conseguimos explicar. “Sic transit gloria mundi” diziam os romanos: assim transita a glória neste mundo. Ou então é apenas como disse Freud: “ Não somos apenas o que pensamos ser. Somos também o que lembramos e aquilo de que nos esquecemos”.

José Auzendo

9 comentários:

  1. Olá Professor Auzendo
    Li esta sua estranha experiência que na realidade é difícil de entender.
    Não por experiência própria, mas porque já tenho sido alertada, sei que por vezes o nosso cérebro dá "sinais" que nós não entendemos, não ligamos, e mais tarde sabe-se que era o aviso de que algo que não estava bem. Não foi o seu caso uma vez que de imediato contactou o médico que o tranquilizou.
    Talvez seja algo para ser analisado em psicologia ou parapsicologia, algo mais profundo do que o "simples ir ao médico e receitar-nos um medicamento".
    Obrigada por partilhar connosco uma experiência pessoal tão estranha mas que poderá ser um alerta para todos nós.
    Desejo que esteja tudo bem consigo e que não volte a sentir algo semelhante.
    Um abraço
    Lourdes.

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    1. Venho apenas esclarecer que no comentário que coloquei acima referi-me como "Professor Auzendo". Sei que não gosta da palavra e que tinhamos combinado eliminá-la. Mas é a força do hábito. Espero que me desculpe, Amigo Auzendo. Assim está melhor?
      Um abraço
      Lourdes.

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  2. Vou contar uma experiência que acompanhei de muito
    perto e que não sei se se pode ou não comparar com
    o que lhe aconteceu.
    Estava com uma amiga a quem lhe tinha morrido um filho, num crematório e de repente ela começou a
    perguntar-me o que que estava ali a fazer, o que tinha acontecido e quem estava naquele caixão.
    Tentei explicar-lhe, mas ela continuava numa negação absoluta e veio de Lisboa até ao Sobral
    sempre nesse estado.
    Foi chamado o médico a casa que a medicou e só
    passadas algumas horas, depois de ter dormido é
    que voltou à realidade.
    Apanhei um grande susto pois pensei que ela tinha perdido o juízo.
    A única explicação que me foi dada na altura é
    que quando alguém passa por um grande trauma ou
    uma situação muito dramática, pode haver involuntáriamente uma rejeição ao facto e é uma defesa natural do próprio organismo para não sofrer tanto.
    Acho que isto não tem nada a ver com o que lhe aconteceu, contudo quis partilhar esta experiencia.
    A nossa mente é um grande mistério e por vezes
    nem os médicos conseguem entender, apesar de tanto estudo e conhecimento, o que lá se passa.
    Um abraço. Manuela

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  3. Claro que está melhor assim, Lourdes. É curiosa esta nossa dificuldade em escrevermos só o nome das pessoas, precisamos sempre do doutor, do engenheiro, do senhor, da dona, do professor, do amigo...Há muito que, secretamente, "luto" nestes escritos contra isso. Por isso, amiga Lourdes, escrevi só, atrás, Lourdes, e é assim que vou continuar a escrever. Lourdes, Alexandrina, Rosa, Afonso, Maria...
    Auzendo

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  4. Meu caro professor, li atentamente o seu testemunho e até já pesquisei na net, por ser para mim muito estranha a sua “amnésia momentânea”; e afinal pelo que li não é assim tão estranha, é uma perda de memória que se vai recuperando sem deixar qualquer tipo de mazelas e que pode nunca mais acontecer e que não deve acontecer, isto foi o que entendi do que li.

    Quando comecei a ler sua narrativa pensei: “Ai! Será que o professor Auzendo está a ficar velhote? Desculpe a minha ignorância… depois vieram-me mais ideias à cabeça e fiquei preocupada. E, conforme fui lendo o seu texto, verifiquei que o senhor é uma pessoa previdente e fez o que tinha de fazer, foi de imediato ao médico e a TAC feito não acusou nenhum mal …óptimo.

    O professor não teve qualquer relutância em partilhar esta experiência connosco, o que para mim foi um acto de coragem. Será que Freud teria no seu tempo resposta para este breve estado de amnésia?

    Como não entendo nada de psicologia e ignoro completamente o comportamento do nosso cérebro, e na tentativa de querer entender o que não entendo… tentando dar-lhe uma resposta completamente parva, mas baseada na minha vontade, quero que tenha sido só e apenas um lapso de memória e um pouco de pânico…Os amigos querem sempre arranjar soluções para que eles não sofram e pretendem aliviar-lhes a dor, quando há necessidade disso.

    A amizade é um sentimento que não nasce espontaneamente, vai-se cultivando, e eu tenho ao longo dos tempos cultivado e fazendo crescer uma relação de amizade com pessoas que há anos atrás nem sequer sabia que existiam. Por tudo isto que acabo de escrever, e que não sei bem como me exprimir, é no fim e sobretudo para lhe dizer: o que lhe desejo meu amigo é que esta experiência não se volte a repetir, porque de facto devia ter sido muito angustiante. Força professor…
    Maria Alexandrina


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  5. Sr. Auzendo,
    Depois de ler o que o Sr. escreveu no seu comentário , acha que está melhor assim? não dá muito geito mas enfim, vou tentar. Li com muita atenção e interesse o seu texto, no minimo achei realmente muito estranho. Fiquei a pensar, como é possível acontecerem situações desta natureza. Daqui podemos concluir que, embora o corpo seja nosso, afinal não conhecemos assim tão bem as suas reacções. Em relação ao facto de imaginar ter visto uma pessoa a chorar, fez-me lembrar sonhos que, por vezes temos sobre coisas que, nunca vimos,falámos e nem sequer imagimávamos que podessem existir. São mistérios da natureza, e por mais perguntas que possamos fazer, para as quais não encontramos resposta. Felizmente que está tudo bem com a sua saúde, isso é o mais importante.
    Um abraço
    Rosa Santos

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    1. Rosa, por agora vou só responder à sua pergunta...Acho que está (só) um bocadinho melhor assim...embora no meu dicionário eu não tenha encontrado aquela "palavra" Sr.
      Auzendo

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  6. Cheguei a pensar não voltar ao tema desta minha experiência, mas pareceu-me que se justificavam algumas palavras. Antes de mais para me mostrar sensibilizado com os votos formulados de que tudo tenha regressado à normalidade. Para já sim, não voltou a repetir-se nada de parecido.

    É bom o alerta da Lourdes ao dizer que por vezes o nosso cérebro dá sinais a que não ligamos, e mais tarde sabe-se que era o aviso de que algo não estava bem. Isto é válido para todas as faixas etárias, do cérebro, do coração, mas claro que os “sexalescentes” devem levar mais a sério esses sinais.

    É muito interessante e rara a história contada pela Manuela, mas sabe-se que o nosso cérebro, perante situações demasiado traumatizantes, que podem por em causa o equilíbrio mental da pessoa, como que bloqueia, e recusa “tomar conhecimento” desses acontecimentos. Já li sobre isso. Sim, é um grande mistério, essa nossa mente.

    A ficar velhote estou, Alexandrina. Mas creio que não foi mesmo um acto de coragem contar essa experiência. Contei-a logo à empregada do consultório, estando mais duas ou três pessoas a ouvir. E disse logo ao médico que já tinha contado a história, pelo que, frisei-lhe, ele estava, neste caso, desvinculado do dever de sigilo profissional. Acho que estar doente e morrer são componentes da vida, tenho dificuldade em perceber tanto “secretismo” que por vezes se faz sobre as nossas “mazelas”. Mas, claro, cada qual sabe de si...

    Espero, para terminar, que a Rosa tenha razão: que também para o “mistério” que foi essa minha experiência nunca mais encontre resposta, por muitas perguntas que possa fazer. É que se vier a obter “resposta” … pode ela não ser agradável.

    Auzendo

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  7. Contar essa sua experiência é muito útil para que todos possam estar atentos.
    Obrigada
    Adelaide

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