Alguém
comentou, a propósito dos artigos para este Blogue, que seria
interessante dar a conhecer uma mulher que, de uma maneira ou de
outra, tenha influenciado a vida quotidiana do Sobral. Sabe de
alguma? Perguntaram-me. Sei, sei de uma Mulher que, muito embora
fosse popular, porque se dava com todos os que dela se abeiravam, não
tinha por hábito meter-se na vida de cada um. Era discreta,
extremamente cuidadosa em não ferir susceptibilidades, respeitosa
quanto a partidos e religiões ou condutas gerais. Tratava todos de
igual maneira, com um sorriso que nada tinha de cínico, com a
condescendência normal de um ser diferente e mesmo superior. Essa
Mulher amou de facto as pessoas do Sobral, que não era a sua terra
natal.
Nasceu
em Lisboa, oriunda de uma família que tinha as suas raízes na
Ericeira, onde existe hoje ainda um Largo com o nome da sua família.
Chegou ao Sobral, onde comprou a velha Farmácia Costa e alugou uma
casa que, desde o princípio, ficou aberta para quem dela se
aproximasse. Farmacêutica de profissão, solteira por opção, teve
um colaborador directo desde a primeira hora, o Sr. Fausto como todos
o chamavam, que lhe dedicou desde a maior lealdade e consideração.
Fica aqui também a minha sincera homenagem a este homem que serviu o
Sobral e seus arredores, sendo respeitado por todos a quem tratava
das maleitas e lhes servia de confidente. Farmacêutica e técnico de
saúde formaram uma dupla importante na vida do Sobral. A velha
Farmácia Costa existe ainda, pertencente a familiares da sua
ex-proprietária. É um marco quase histórico da vila e haveria
muito a dizer sobre ela e sobre o Sr. Costa que lhe deu o nome.
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Foto de Armário da Farmácia Costa |
Esta
Mulher a que me refiro preencheu os vazios de várias juventudes, até
que chegou à minha. Como vivíamos numa terra pequena, com
horizontes apertados e diminutos, tínhamos muita dificuldade em
alargá-los e expandi-los, mas desde que fosse na companhia desta
Senhora e debaixo da sua protecção, tudo nos era permitido. Era
como uma mãe bondosa que nos abria as janelas para a vida e nos dava
asas para voar. No cinema; no teatro; no ballet; em concertos,
exposições, palestras... Também nas "farras", quase
sempre em Lisboa, mas não só: passeios pelo país, por Espanha e
por aí além, aí estava ela, com um grupinho de jovens, dando-lhes
a oportunidade de saírem da “pasmacenta” e atrasada vidinha
provinciana. Era católica praticante. Na Igreja quanta coisa bela
lhe saiu das mãos e do seu querer generoso e bom, mas também da
máquina registadora da farmácia. Sim, ela não se ficava no que se
devia fazer, ela fazia e pagava, sem alardes nem exibições, sempre
no silêncio da sua generosidade.
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Foto de Armário da Farmácia Costa |
Quantas
famílias chegadas ao Sobral, “com uma mão atrás e outra à
frente”, ela ajudou, desde arranjar-lhes uma casa, um colchão e
manta para viverem; quantos remédios saíram daquela farmácia para
tratar doenças e maleitas…gratuitamente, claro. Esta Mulher fundou
no Sobral a obra de S. Vicente de Paulo, mas não quis ser
presidente, apenas foi vicentina, não tinha feitio para lugares de
destaque, dizia ela. Trabalhava afanosamente um ano inteiro, fazendo
todo o tipo de artesanato, para que, nas festas de verão, em
Setembro, houvesse uma "Venda" vicentina que ainda hoje
existe. Com o seu espírito ameno e generoso, conseguia fazer a paz e
a concórdia entre todas as vicentinas e garanto-vos que não era
tarefa fácil. Mas ela lá estava para o que desse e viesse.
Sugeriram-me
um apontamento com poucas palavras, breve, mas não é possível
falar desta Mulher apenas com meia dúzia de palavras e mesmo assim
fica tanta coisa por dizer...Nunca eu seria o que sou hoje se ela não
tivesse sido parte integrante da minha vida, tanto na minha vida
moral, como na minha vida espiritual. Devo-lhe quase tudo o que sou e
isso agradeço-lho todos os dias. Continuo a sentir uma grande
saudade dela. Faz-me falta.
Esta
Mulher chamou-se MARIANA FIGUEIREDO CARDOSO.
Mimi