![]() |
Agosto de 1961 (15 anos) |
Nessa
época em que comecei a “despertar para o público” morava em
Benfica na rua do antigo lar dos Benfiquistas. Quando os futebolistas
passavam pela minha casa ouviam o acordeão e despertou-lhes a
atenção. Vezes sem conta apareciam músicas na caixa do correio,
sem eu nunca ter descoberto o autor de tal façanha. Até que, sem eu
saber como, alguém foi a minha casa fazer-me uma proposta para eu ir
participar numa festa do Clube Futebol Be
nfica,
a tocar uma valsa para dois bailarinos dançarem. E a seguir à
experiência com as ceifeiras, esta foi a minha estreia “como
acordeonista” num palco, no Cinema da Venda Nova. Fui muito
aplaudida julgo que por ser uma miúda, pois naquela época, uma
menina a tocar acordeão não era lá muito visto.
Entretanto,
quando já tinha 16 anos, uma vizinha que gostava muito de mim e
conhecia o Professor Vitorino Matono, pediu licença aos meus pais
para me apresentar ao Matono, para ver se eu poderia frequentar as
aulas na escola dele. Mandou-me fazer um teste e escusado será dizer
que fiquei. As suas palavras para a amiga foram: “A pequena tem
muito jeito”. E lá andei até aos meus 19 anos, tendo chegado a
participar no primeiro conjunto formado por ele “CONJUNTO MUSICAL
MATONO”. Ele dizia que eu a ler música era um “caso muito sério”
pois lia rápida e correctamente. Já a tocar era menos habilidosa. E
para meu espanto, o meu papel no conjunto era a tocar num acordeão
contrabaixo, que nem sequer tem botões na mão esquerda. Foi uma
experiência que adorei. Éramos 6 elementos, todos com acordeão,
sendo que o meu era o contrabaixo e eu o único elemento feminino.
![]() |
Verão de 1963 (17 anos) |
Acabei
os meus estudos e contrariamente à ideia de meus pais, arranjei
emprego e iniciei o namoro com o meu futuro marido, que entretanto já
tinha deixado a orquestra de bordo e mudado de profissão. Apesar de
nunca me ter dito nada, sempre soube que não aceitaria de bom grado
que a minha vida passasse por uma faceta musical, pois por
experiência própria, sabia que seria difícil conciliar a vida
familiar com a artística. E para mim, o que estava em 1º. lugar era
a família, e este jovem foi na minha vida o meu Príncipe Encantado.
E logo me comecei a afastar lentamente das festas públicas, de livre
e espontânea vontade para não lhe desagradar, pois já não saberia
conceber a minha vida sem ele. E as últimas actuações como
animadora de bailes, que me lembre, foram em Turquel e Unhos. Esta
última deixou-me uma saudade especial. Era numa colectividade com
muita gente e eu sozinha no meio do palco. Claro que tocava músicas
da época, mas faltava acompanhamento. E eis que um jovem saltou para
o palco e começou a tocar numa bateria que lá se encontrava. Para
mim uma novidade. Nunca tocara assim, ainda por cima sem ensaios, e
ao acertarmos “o passo” tão bem, deu-me um entusiasmo que toquei
horas a fio sem sentir cansaço. Porém nessa época, apesar de andar
sempre a cantar e tocar, não tinha ainda a consciência da minha
verdadeira vocação. E o 1º. trabalho que rejeitei foi fazer uma
passagem de ano em Turquel, local que já me tinha contratado uma vez
e onde fui muito acarinhada.
Pus
os pesos na balança, de um lado a música com toda a alegria e
entusiasmo que me proporcionava, do outro o meu casamento realizado
apenas há 3 semanas, e claro que o prato do coração pesou mais.
A
partir daí nunca mais aceitei trabalho algum musical. O meu marido
nunca interferiu nas minhas decisões, mas soube depois pela minha
cunhada que achou a minha atitude muito sensata. Sensata ou não, foi
o que na altura achei que deveria fazer.
Lourdes Henriques
Lourdes Henriques
Já revelei que não foi fácil "convencer" a D. Lourdes a escrever a sua "biografia musical". Um dos argumentos que me apresentava era: "já não estou com cabeça para isso". É caso para dizer: como seria se estivesse?
ResponderEliminarContinuamos a assistir, neste terceiro capítulo, ao desenrolar sereno mas intenso de toda uma carreira cheia de sucessos. E quem havia de dizer que aquela que, aos 16 anos, não deixou de ir tocar, toda de preto vestida, três dias depois da avó morrer, no que foi a sua primeira actuação profissional, no Carregado, acabaria por deisistir uns anos depois devido ... a um dito "príncipe encantado"...
Vimos que muito do que nesta saga a D. Lourdes nos escreveu é novidade para os filhos, que unanimemente aqui têm vindo dar testemunho disso mesmo, e não só. E só isso já faz a diferença.
José Auzendo
Amiga Milú
ResponderEliminarÉ uma história de encantar,até tem um "princepe"!!!
Tem vindo a prender desde o primeiro dia...e no auge surge a escolha...
Foi dificil e intensa creio...mas certa!!!(sem queixas)
De qualquer modo aqui a temos inteirinha a animar a "malta"
Parabéns!!! adorei!!!
Bjs
D. Lourdes, este capítulo da sua história podia começar: “Era uma vez…” com a diferença que o seu príncipe encantado, ao contrário do “tal” da história, não apareceu montado num cavalo alado branco, mas num acordeão… - alterando o destino da “princesa” a quem se adivinhava uma carreira bem diferente daquela que veio a escolher- … escreveram a história à sua maneira e construíram o seu castelo…
ResponderEliminarHoje deu-me pra ‘qui (espero que não se zangue) :-)
Inês
Amiga Inês
EliminarZangar-me porquê? Se fosse para me zangar não teria contado a história. É verdade, o meu "príncipe apareceu com um adordeão" mas andou vários anos a dar música por outros lados. Só 4 anos depois é que "descobriu a princesa adormecida" ...
Fico contente pela minha "história" ter originado comentários muito engraçados e curiosos! É que esta é uma "História Real" que por vezes até parece ficção!
Obrigada por ter gostado e acompanhado.
Beijinhos da
Lourdes.
Amiga Lourdes é sempre um prazer lê-la. Escreve e descreve os acontecimentos da sua vida musical e não só, na perfeição, como é natural em si...
ResponderEliminarA culpa não foi só do pai de se opor ao que seria, com toda a certeza, uma brilhante carreira musical. Mas um certo menino, com cara de anjo e de flecha ao ombro, atirou-lhe uma certeira ao coração. Embora tivesse sido um decisão só sua, O "Cupido" aquele grande maroto, deu-lhe volta ao juízo e lá se foram o canto e o acordeão. Não se pode pôr a culpa só ao pai..
Desculpe a brincadeira, quem sou eu para dar sugestões a alguém sobre se agiu bem ou mal, mas que o fez po amor!
Um abraço
Maria Alexandrina
Olá Linda
ResponderEliminarQuando na vida nos deparamos com uma "encruzilhada", nunca
sabemos se fazemos a escolha acertada...
Uma coisa podes ter a certeza, há algo que fizeste e fazes,
como ninguém...
Ser MÃE!!! (sou suspeito eh eh)
Filho Velho Babado
Cresci a ouvir histórias contadas pela minha mãe, que devido à sua expressividade natural, as contava como ninguém ( maninhos, perdoem-me...:-(). De todas elas, as que mais gostava eram as "da vida real", deste "príncipe" e desta "princesa" que, como já alguém aqui escreveu,foram construindo o seu castelo encantado e "viveram felizes para sempre"... pelo menos era assim que eu pensava!
ResponderEliminarAdmiro todos aqueles que têm a capacidade e coragem de abdicar de tudo em prol de um sentimento tão nobre(algo raro nos dias de hoje...). Se a escolha foi certa ou errada, quem poderá dizer? Foi feita em plena harmonia com o coração.
Quero agradecer ao professsor Auzendo o desafio que lançou à "princesa", pois de outro modo estes pormenores deliciosos perder-se-íam no seu "jardim das memórias".
Nesta encruzilhada, em que um grande amor afastou uma possível carreira artística, a paixão pela músisa e o desejo de construir uma família fruíram, lado a lado...não terá a princesa conseguido o melhor de dois mundos?
Marina Henriques
Olá querida amiga.
ResponderEliminarJá vamos no terceiro capítulo do seu romance. Uma história bem contada, excelente lição de vida onde o amor falou mais alto. Teve um percurso artístico muito curto. Optou por aquilo que achou melhor, aquilo que se faz por amor está sempre além do bem e do mal. Tem uma família bonita, uns filhos que falam da mãe com muito orgulho. É uma história que expressa um final feliz.
Beijinhos da amiga
Mariana
É com muito prazer que devolvo à Marina Henriques os agradecimentos que expressa: nós, os seniores deste blogue, é que devemos estar-lhe gratos pela sua presença entre nós. Já antes de saber "quem ela era" (era outra a frase que ia saindo!) ia lendo com prazer o que ela escrevia, e cheguei mesmo a citar uma frase sua num meu comentário.
ResponderEliminarEspero que continue por cá, e, se possível, com participação cada vez mais variada: não tendo nós a pretensão de ensinar nada, temos todos experiências que será interessante partilhar, e também para isso é que este blogue existe.
O último parágrafo desta minha nota foi-me "roubado" pelas duas últimas linhas, acima, da D. Mariana; subscrevo-as, melhor não era possível dizer.
Professor Auzendo, o prazer é meu em poder aprender com todos os que por aqui vão deixando testemunhos da "vida real", por isso, continuarei com muito gosto a dar uma espiadela sempre que possível.
ResponderEliminarJulgo que este espaço foi criado com a intenção de colmatar a exclusão social que muitas vezes arrasta os mais velhos, provando-lhes que não perderam capacidades, valor e o seu lugar na sociedade.Muito pelo contrário. A comprová-lo está tudo aquilo que aqui é escrito e comentando por esta "gente muito gira"...pelo que, considerem o objetivo cumprido e ultrapassado!
Até breve
Marina Henriques
Só agora tive oportunidade de seguir este "lindo conto de fadas" do qual sou também uma personagem secundária. E a Princesa tornou-se Rainha e criou 4 belos rebentos (pelo menos dizem os entendidos na matéria, modéstia à parte)... O que de melhor ficou no meio de todo este enrredo, é que apesar de todas as "marretices" q o dia-a-dia impõe a um casal com 40 e tantos anos de comunhão, é LINDO ler a expressividade e carinho com que escreves estas palavras. Sem amargura, de peito aberto e acima de tudo, com muito AMOR!! É incrível que ao fim destes anos todos, consegues surpreender e mostrar que "uma simples" história de vida, pode afinal ser um lindo conto de fadas em que (os marretas) viveram felizes para sempre :-)
ResponderEliminarQui ça, fonte de inspiração para todos nós!!
Continua assim Mamy Doce.
Bjks da Filha Rabina