Depois
do meu pai se convencer, lá voltei encantada novamente às lições
e treinos do piano.
A
professora já era outra freira. Tinha fama de ser terrível e várias
vezes a vi castigar com um “pauzinho”, os dedos de algumas
colegas quando erravam as notas do piano. Por incrível que pareça,
fui sua aluna durante cerca de três anos e nunca soube qual era o
gosto desse pauzinho que ela tinha sempre à mão. Para freira, era
“meiga” demais!
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1960 Liceu de Macau (14anos) |
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1960 Comemorações Henriquinas |
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1960 com colegas do Liceu |
Ao
regressar de Macau, uma viagem no Paquete Niassa que durou 50 dias,
travei conhecimento com o acordeonista da orquestra de bordo, com
quem viria a casar 5 anos mais tarde.
Um tio meu que morava em Alhos Vedros, cujo filho
(meu primo, portanto) também tocava acordeão e dava aulas, ao
ouvir-me tocar mexeu logo os “cordelinhos” para eu ter uma
licença para poder tocar em público, documento necessário naquela
época para dar espectáculos, uma vez que era menor e não podia ter
ainda carteira profissional. Apesar dos muitos e grandes protestos do
meu pai, o meu tio lá conseguiu convencê-lo, e obtive a tal licença
em Setúbal.
E
a minha 1ª. experiência em dar um baile a troco de dinheiro, tinha
eu apenas 15 anos. Foi na Monda do Arroz, no Carregado. Só que,
tristemente, calhou num dia terrível. O baile foi combinado com
cerca de 1 mês de antecedência e 3 dias antes, morre a minha avó.
Apesar das voltas que o meu tio deu para mudar o dia do baile ou
arranjar outro acordeonista, na véspera do evento, nada conseguiu. Teríamos que indemnizar a organização pelas despesas, e então no
dia seguinte ao funeral da minha avó, lá fui eu dar o meu 1º.
espectáculo público.
Escusado
será dizer que nessa época, apesar de muito nova, andava toda
vestida de preto o que, mesmo que eu quisesse, não me deixaria
abstrair do desgosto que tinha tido pela morte da única avó que
conheci e com quem convivi apenas 6 meses depois de ter chegado de
Macau.
Mas
lá me saí muito bem e acabou por ser uma noite muito engraçada e
divertida com as ceifeiras todas à minha volta. Como “criança”
que ainda era, e como não havia comboios de noite para nos trazer de
volta a Lisboa, tivemos que lá ficar os 3 a dormir: eu, o meu pai e
o meu tio. E as ceifeiras que eram imensas, levaram-me com elas para
uma casa enorme onde dormiam todas no chão. E foi no meio delas que
fiquei a dormir o resto da noite. Foi esta a minha 1ª. experiência
a tocar publicamente em Portugal Continental, jamais poderei esquecer!
Lourdes Henriques
Lourdes Henriques
Olá Milú
ResponderEliminarMas que que vivencia tão emocionante!!! E muito bem descrita. Emoções, amores,publico,viagens tudo isso encimado com a paixão pela musica. Até aqui lindo!!!
Fico-me á espera...curiosa do crescimento da estrela, tem brilho para isso...
Parabens e bjs
Olà amiga Lourdes, pois adorei a sua historia e como diz a amiga avoluisa, pois tem muito geito para isso, pois queremos mais! Com um beijinho Anna
ResponderEliminarAmiga Lourdes, a sua primeira experiência como "profissional", que nunca esquecerá, acabando por dormir uma noite rodeada de ceifeiras, trouxe-me à lembrança o livro "Vindima" de Miguel Torga, na parte em que o autor descreve como homens e mulheres, que desciam da serra para as vindimas do Douro, dormiam em camas de palha por cima de um chão de terra batida, numa casa ampla, divididos apenas por uma meia parede, que se completava com um reposteiro de teias de aranhas chegando a um telhado de telha vã, por onde passava a luz da Lua e se adivinhava um céu estrelado. O livro foi escrito em 1945, mas lembro-me de, por volta de 1950, na minha terra, em que quase todas as propriedades pertenciam uma família latifundiária, virem do Norte os "malteses" e, também estes, se acomodavam numa casa ampla. Como havia no grupo rapazes e raparigas novos, os meus primos e primas, que viviam na aldeia, de vez em quando, quando tinham disposição para o fazer, iam ao "quartel" para um bailarico e levavam-me com eles.
ResponderEliminarUm ou mais tocadores de harmónica de boca soltavam no ar as suas chulas e malhões e, com cantigas ao desafio, assim se entrava pela noite dentro, fazia-se a festa e arranjavam-se namoricos.
A realidade que observou na sua experiência devia ter sido menos deprimente do que a que assisti, porque foi uns anos mais tarde, mas não deixou de ser para si uma visão de vida, muito diferente daquela a que estava habituada. Ainda bem que foi acarinhada e se sentiu feliz, a sua música deve ter sido um bálsamo para as ceifeiras, mulheres que passavam os dias enterradas nos terrenos alagadiços, dobradas na monda do arroz. Ainda bem que lhes levou a sua música e a sua simpatia.
Beijinhos
Maria Alexandrina
Minha Querida, Gostei Muito!!!
ResponderEliminarContinua com a tua Odisseia...
Somos todos "ouvidos" e olhinhos ah ah ah
Beijinhos
Filho Velho
Boa noite Lourdes.
ResponderEliminarMuito obrigado , por ter partilhado com os seus amigos e leitores deste blog, a paixão que tem pela música, e das voltas que sua vida deu até chegar ao Sobral. Feliz de quem que tem boas recordações do seu passado. “Recordar é viver”
Gostei muito.
Beijinhos da amiga
Mariana
Que bom conhecer ainda mais pormenores da tua juventude!De facto tiveste sorte em muitas coisas bonitas que a vida te reservou. Essa forma positiva de veres a vida,perfumada com uma certa ingenuidade, fez com que aproveitasses ao máximo tudo o que viveste e te sentisses grata por isso(Ainda hoje é assim! ).As pessoas fazem os lugares, os momentos, através da forma com que os vêm e os partilham com os outros, e tu tens o condão de tornar tudo tão cor-de-rosa... ;-)
ResponderEliminarVou continuar a "espreitar", pois adoro saber pormenores que desconhecia sobre o teu percurso musical, que tanto influenciou o meu... E que outros partilhem também as suas memórias, pois como diria a canção "recordar é viver"!
Beijinhos
Marina
A sua vida dava um filme. Afinal o seu pai, apesar de não querer ouvir falar em “artista”, foi contribuindo para lhe alimentar o “bichinho”.
ResponderEliminarDo piano ao acordeão, foi só o tempo de arranjar um chinês - nunca imaginei um chinês a tocar acordeão, deve ser giro, calculo o seu espanto – e, para assegurar que em 50 dias de viagem não esquecia o aprendido, nada como travar “conhecimento com o acordeonista da orquestra de bordo…” do navio. Já conhecia a história, mas confesso que adorei vê-la aqui escrita com uma adorável simplicidade, como se esse acontecimento não fosse determinante na sua vida.
Inês
Pois é amiga Inês, não queria, não queria, mas quando os amigos iam lá a casa, "o bibelot" tinha que fazer entretenimento. E quer saber a melhor? Quando passei do 2º. para o 3º. ano do liceu, sabe qual foi o presente? Adivinhe! Nada mais do que um BANDOLIM! Fiquei a olhar para ele como "um burro para um palácio!" Esse nunca consegui dominar!
EliminarQuanto ao conhecimento de bordo ... "O destino marca a hora"! A música foi a culpada!
Beijinhos
Lourdes.
És sem dívida uma fonte de inspiração!! Devias escrever histórias para crianças... e n precisas de muito para fazer sorrir..
ResponderEliminarAdoro-te!!
Filha Rabina