
Contava-se
que um dia uma senhora foi à oficina do Senhor Vicente Rolo e disse:
“Senhor Rolo, põe-me meias solas nos meus sapatos, enquanto eu vou
à loja comprar meio quilo de cebolas?”. Mesmo à velocidade a que
hoje se fazem as coisas seria impossível fazê-lo com tamanha
rapidez, quanto mais à velocidade de há setenta anos atrás. Umas
meias solas…não sei quantas horas levavam a deitar, mas eram
muitas…A sola tinha que estar de molho para ser esticada e moldada
ao sapato ou bota, era cosida e também era “brunida” com um
ferro quente e cera, para ficar reluzente, uma autêntica obra
de arte. Um trabalho inglório porque ninguém apreciava e,
depois de calçados os sapatos era a parte que calcorreava o chão.
Mas a dignidade de quem fazia este trabalho estava acima de tudo, e
tinha que sair perfeito e bem "brunido”…
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Ferramentas de Sapateiro |
O
Senhor Vicente riu-se do pedido e respondeu à senhora que deixasse
os sapatos, que eles estariam arranjados quando viesse na semana
seguinte ao Sobral. Porém, a conversa chegou aos ouvidos dos
empregados, e assim esta história passou de boca em boca...
Continuando…
As pessoas vinham à vila em busca do que não havia nas suas terras;
para se deslocarem utilizavam ou a carroça puxada por um cavalo
ou somente um burro. Os homens “escarranchavam-se” no dorso do
burro e as senhoras sentavam-se de lado, protegidos pela albarda e lá
faziam os seus percursos, alguns bem longos. Para não levarem o
jumento para dentro da vila, tinham “o parque de estacionamento”,
nas entradas da vila: as oficinas dos ferradores Senhores Veríssimo
Horta e Mário Lopes (Mário Ferrador). O Sobral era nessa época uma
vila de muito comércio, mercearias, talhos, tabernas, sapateiros,
alfaiates, cutileiros, ferradores e albardeiros, e era grande o
movimento de compradores. A vila era muito pequena, a concentração
era em menos espaço, e via -se sempre bastante gente nas ruas,
principalmente aos sábados e domingos. Esta espécie de comércio
tem-se diluído ao longo dos anos, efeito da evolução dos tempos.