![]() |
S. Domingos de Carmões |
Um
dia
acordou
bem-disposto,
chamou
o
meu
avô
e
propôs-lhe
que
se
ele
desbravasse
aquela
pequena
courela
ele
lha
dava,
porque
destoava
do
terreno
cultivado
em
redor.
Ora
o
meu
avô
ficou
encantado
e,
com
a
ajuda
da
minha
avó
Ana,
a
Ti’Anica,
como
era
conhecida
na
Corujeira,
onde
viviam,
arrancaram
mato,
plantaram
vinha
e
árvores
de
fruto
e
ainda
dava
um
bocadinho
para
a
batata
e
a
horta.
Era
um
miminho
criado
com
muito
apego
e
amor.
“Recordo
com
saudade
o
meu
avô,
com
o
seu
barrete
preto
e
o
cigarrito
ao
canto
da
boca,
a
puxar
a
junta
de
bois
do
patrão
(…)
que
(…)
vinha
mais
tarde
na
sua
charrete”:
assim
escrevi
ao
recordar
a
Feira
dos
Santos.
São
estes
os
personagens
desta
história.
Nada
ficou
escrito
sobre
a
courela,
foi
só
apalavrado
por
boca
e
assim
o
meu
avô
passou
a
ter
a
sua
propriedade
para
cuidar.
Passaram-se
mais
de
quarenta
anos,
o
patrão
morre
e
o
filho,
ao
ir
fazer
a
escritura
de
habilitação
de
herdeiros,
verificou
que
o
bico
da
propriedade
amanhada
pelo
António
Cunha,
meu
avô,
também
fazia
parte
da
herança.
Por
mais
que
lhe
fosse
explicado
o
que
se
tinha
passado,
nada
demoveu
o
herdeiro.
Como
nesta
altura
o
meu
avô
já
rondava
os
oitenta
anos,
intervieram
familiares
para
que
o
velhote,
no
fim
da
vida,
não
sofresse
o
desgosto
de
ficar
sem
o
seu
pedacito
de
terreno.
![]() |
Justiça de Fafe |
Nada
demoveu
o
senhor
em
questão
que
decidiu
recorrer
ao
tribunal,
para
se
valer
dos
seus
direitos.
Devido
a
toda
esta
complicação,
agravou-se
no
meu
avô
uma
doença
oncológica,
que
o
levou
em
três
semanas.
Ficou
a
minha
avó
com
a
responsabilidade
de
ir
ao
Tribunal
de
Alenquer
e,
como
já
era
velhota,
não
tinha
qualquer
dente
na
boca:
esta
explicação,
que
parece
não
ter
lógica,
é
importante
para
o
resto
da
história…
Na
audiência,
explicou
a
minha
avó
tudo
como
se
tinha
passado
e,
quando
acabou,
o
advogado
de
acusação
disse:
-
Esta
mulher
está
a
mentir
com
quantos
dentes
tem
na
boca.
A minha avó não precisou de advogado, levantou-se, pediu licença ao juiz para falar e disse:
- Senhor Dr. Juiz para provar que é verdade tudo o que acabo de dizer, pode verificar que não tenho qualquer dente na minha boca.
A minha avó não precisou de advogado, levantou-se, pediu licença ao juiz para falar e disse:
- Senhor Dr. Juiz para provar que é verdade tudo o que acabo de dizer, pode verificar que não tenho qualquer dente na minha boca.
O
certo
é
que
a
minha
avó
ficou
sem
o
marido
e
sem
o
seu
miminho,
a
sua
terra:
recebeu
uma
indemnização
pelos
benefícios,
uma
ninharia,
mas
foi
uma
mulher
que
não
se
deixou
intimidar.
Aqui
te
fica
esta
homenagem,
minha
querida
avó,
que
eras
uma
lutadora.
Maria
Alexandrina
Olá amiga Alexandrina
ResponderEliminarParabéns pela avó lutadora que teve, que sem papas na língua, não precisou que advogado algum a defendesse.
Só é pena é que a justiça nem sempre pese para o lado certo da balança ...
Um beijinho da
Lourdes.
Este é mais um "fresco" de uma época muito bem pintado pela D. Alexandrina: uma história de quatro pessoas que nos remete para todo um ambiente social e político, a que nem falta a Justiça (ou a injustiça, se quisermos ser ... justos).
ResponderEliminarE claro, a terra a quem a trabalha. Nem de propósito, vem hoje nos jornais (Público, pag. 18), que o Governo quer criar "uma bolsa de terras" para disponibilizar a "interessados na sua exploração agrícola". Mas, coitados dos proprietários, os incentivos que o (des)governo lhes dá são pequenos...E, assim, lá deixam que o mato invada os terrenos...Agora já não é feio, valha-nos isso!...
José Auzendo