Está
a aproximar-se o Natal e as recordações de infância assaltam-me a
memória … É como o desenrolar de um qualquer novelo, elas surgem
e eu seguro-as porque me dão muito prazer.
O
meu Natal de criança era passado com os meus familiares, avós, pais
e irmãos; eu, tal como uma encomenda, era enviada mais cedo na
camioneta de carreira, como era uso dizer-se, para a terra. Os meus
padrinhos só iam mesmo na noite de Natal. Eu vivia no Sobral com os
meus padrinhos e os meus pais e irmãos viviam na Corujeira.
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Brinquedos em lata |
Como
a minha
madrinha me
ensinou, eu
tinha por
hábito, como
muitas crianças
neste País,
pôr o
sapatinho na
chaminé, não
me lembro
que os
meus irmãos
o fizessem.
Ora naquele
Natal, tinha
eu cinco
anos, em
1948, fui
como de
costume pôr
na chaminé
o meu
sapatinho novo,
que o
meu padrinho
me trouxera
de presente
da sapataria
do Senhor
Vicente Rolo…
Como ia
contando, pus
o meu
sapatinho e
deitei-me. No
dia seguinte
fiquei radiante,
porque dentro
do sapatinho
estava uma
máquina de
costura miniatura,
em folha.
Olhem! Gritei
eu…o
que o
menino Jesus
me deu.
O meu
padrinho viu
toda a
minha euforia
e esperou
que ela
acalmasse; depois,
sentando-me na
sua perna,
explicou-me que
o menino
Jesus não
me tinha
dado nada,
que aquela
máquina tinha-a
ele, padrinho,
comprado na
loja do
Pipocas. E
que as
prendas eram
boas ou
más, muitas
ou poucas,
conforme o
dinheiro que
os pais
dos meninos
tinham.
Acho
que não
me chocou
esta explicação,
mas durante
uns anos
continuei ainda
a pôr
o sapatinho
na chaminé,
na esperança
de que
um dia
o Menino
Jesus se
lembrasse de
me dar,
também ele,
uma prenda.
Passaram-se
os anos, cresci, casei, tive as minhas filhas e sempre elas, como eu,
puseram o sapatinho na chaminé. Com o passar dos tempos, houve
modificações e deixou de ser no dia de Natal que se abriam as
prendas, mas na noite da consoada, a véspera de Natal, depois da
meia-noite. As prendas já não eram de folha. Eram livros, jogos e
bonitas bonecas. Eu, em criança, sempre esperei que o Menino me
desse uma boneca, mas isso nunca aconteceu.
As
minhas filhas mais velhas já sabiam que não era o Pai Natal quem
dava as prendas. A intenção era a mesma, mas essa foi outra
alteração: o Menino de Jesus passou “a chamar-se” Pai Natal. A
minha filha Iris tinha apenas três anos e, como muito crédula que
era, e que ainda hoje é, acreditava piamente no Pai Natal. Numa
noite de Natal, à meia- noite, as irmãs levaram-na à cozinha, para
que na chaminé visse as prendas…E, para nosso espanto, a minha
querida filha abre muito os seus lindos olhitos, que já de si eram
grandes, e exclama:
-
Mãe, eu ainda vi os pezinhos dele a subir a chaminé!
Ri-me,
mas a espontaneidade e a alegria da minha criança comoveram-me, e
não tive coragem de lhe explicar quem tinha posto as prendas na
chaminé.


Neste
espaço de
tempo, do
meu tempo
ao de
hoje, largas
transformações se
deram no
modo de
festejar o
Natal, no
valor e
na abundância
das prendas;
e até,
já este
ano, o
Papa veio
informar que
a vaca
e o
burro não
faziam parte
do presépio…Certo
é que,
quer se
seja cristão
ou não,
na maior
parte dos
lares portugueses
cumpre-se a
tradição e
festeja-se o
Natal. E
este Natal?
Como vai
ser ele
para muitas
famílias de
Portugal? Penso
que haverá,
mais do
que nunca,
muitos lares
onde o
dinheiro não
chegará para
a comida
… “Mas as
crianças, Senhor…”,
que prendas
vão ter.
Maria
Alexandrina
Olá colega Alexandrina
ResponderEliminarGostei de ler o seu texto. Fez-me reviver os meus tempos de menina. Também punha o meu sapatinho na chaminé e no dia Natal, levantava-me cedo para ver se o menino jesus se tinha lembrado de mim, e lá estava no meu sapatinho, uns rebuçados, umas peúgas, e camisolas eram as prendas que o menino jesus dava naquela época, e havia muitos meninos que não recebiam nada, e ninguém se lembrava se havia gente a passar fome. Felizmente nos dias de hoje há muito boa gente que se lembra daqueles que tem pouco há muitas organizações a partilhar com os mais desfavorecidos.
Um bom Natal, para si e para os seus com muita saúde e muita alegria, são os votos da colega Mariana
Olá D.Maria slexandrina
ResponderEliminarAchei muito "gostoso"o vosso texto.
Também eu punha o sapatinho chaminé...também eu sonhava com o Menino Jesus... meio seculo para tráz,tudo tão diferente!!
Embora pensar no passado nos traga nostalgia,e agora haja montes de problemas,de todos os lados e mais alguns...digo como a Mariana"há muito boa gente que se lembra...dos mais desfavorecidos
"
Votos de um Bom Natal,com muita saude e alegria
Um abraço
Luisa
Tal como a Mariana, também eu (eu e os meus irmãos) me levantava cedo para ver se o MENINO JESUS se tinha lembrado de mim. E acho que mal dormíamos, para ver quem era o primeiro a investigar o interior do sapato. Sim, porque o que houvesse cabia sempre dentro do sapato, ou da bota...
ResponderEliminarE só muito mais tarde, quando já tinha filhas, me dei conta de que o Pai Natal tinha "substituído" o menino Jesus...na distribuição das prendas. E também que as minhas filhas já não jogavam ao "rapa" na noite da consoada, nem pelo dia de Natal adentro...enquanto os pinhões durassem, como na minha infância fazíamos no Norte. Por aqui, também se fazia (e jogava) ao "rapa"? Fica a pergunta...
E um bom natal, claro.
José Auzendo
Olá Amiga Alexandrina
ResponderEliminarEste seu depoimento reporta-me aos meus 5 anos em que também eu punha o meu sapatinho na chaminé e de manhã ia ver o que o Pai Natal me tinha lá deixado. Uma das coisas de que mais gostei foi de um fogão de folha, lembro-me nitidamente, e 2 ou 3 anos mais tarde uma máquina de costura do género da sua, mas com uma boneca de casquinha a costurar e que funciona a corda. Digo funciona porque ainda a tenho e ainda não há muitos anos paguei um dinheirão para que fosse restaurada. São autênticos brinquedos dignos de museu que nos trazem à memória recordações da infância. Hoje, com a evolução dos tempos, talvez haja brinquedos e objectos mais aliciantes do que os de então, mais diversidade e mais poder de compra (apesar da crise), mas a inocência e alegria com que eram aceites e usados nessa ÉPOCA, eram bem diferentes dos dias de hoje ...
Antigamente aceitava-se o que nos podiam dar, hoje exige-se o que muitas vezes não é possível ...
Gostei muito do seu texto.
Um beijinho da amiga
Lourdes.
Temos tantos "Natais" vividos, que não lembramos de todos, era impossível, mas pelos que li dos meus amigos, a Mariana, a Luísa,professor Auzendo e a Lourdes, todos temos recordações dos Natais da nossa infância.
ResponderEliminarFalámos de brinquedos. E as filhós da avó que tinham um sabor tão especial? As fatias paridas e os coscorões? Embora os continuemos a saborear eram tão diferentes os sabores de antigamente.
Professor Auzendo aqui também existia o jogo do "rapa",acho que até com feijões o jogavam, era um jogo de sorte, embora inofensivo,não sei bem como era jogado, via às vezes um grupo de rapazes entusiasmado de cócoras a jogar esse jogo e ao berlinde, eram jogos de rapazes, os nossos jogos eram mais femininos.
Um abraço para todos e os desejos de um bom Ano Novo
Maria Alexandrina
Pois o jogo do rapa lá na terrinha, na minha infância, Alexandrina, era um jogo típico do Natal, que “começava” uns dias antes com a construção das piorras, cada qual a ver quem construía a mais bonita, continuava com a assadura das pinhas (mansas) e extracção dos pinhões na noite da consoada. Jogava-se logo aí nessa altura e, depois, nos dias seguintes até “cansar”, sei lá. Era um jogo familiar, jogado por rapazes e raparigas.
ResponderEliminarDepois de escrever o primeiro comentário, encontrei na net a descrição do jogo, que é longa mas interessante, pelo que remeto para http://santa-nostalgia.blogspot.pt/2008/07/jogo-do- rapa.html. Nessa descrição, faz-se referência a uma tradição judaica, que julgo ser a que poderá encontrar em http://www.coisasjudaicas.com/2012/12/hebraico-piao-de-chanuca.html.
De fatias paridas nunca ouvi falar, mas por lá não havia Natal que não tivesse rabanadas, só que, não, não eram como pensa: nas nossas, o pão era mergulhado em vinho tinto, quente, bem carrascão mas bem doce, e frito depois…Só em Lisboa, aos 25 anos, eu soube dessa de rabanadas com pão mergulhado em leite…Lá também havia as “bêbadas”, que eram o mesmo pão no vinho doce mas sem fritar…Era uma boa maneira de “comer” vinho, o tal que era “o sustento de um milhão de portugueses”, lembram-se?
José Auzendo
Olá outra vez
ResponderEliminarE eu também cá estou de novo a meter a minha "colherada". Embora não tenha grandes conhecimentos dos costumes provincianos, o professor Auzendo só conheceu as "fatias paridas ou rabanadas" aos 25 anos. Mas elas também se chamam "fatias douradas". Quanto às fatias de pão com vinho e açúcar (carradas), sem serem fritas, chamavam-se cá "sopas de cavalo cansado". Julgo que ainda se chama assim por cá. E posso dizer-lhe que eram óptimas, pois eu adorava um "pratinho dessas sopas" ao lanche ... na minha adolescência!
Mas nunca fiquei "bêbada"!
Lourdes.
Eu também vou meter a colherada como disse, a nossa querida colega e amiga Lourdes.
ResponderEliminarNa minha aldeia, as tais "rabanadas" eram conhecidas como "fatias douradas" eram embebidas em leite e fritas em azeite, depois de fritas, polvilhadas em açúcar e canela. Fatias de pão embebidas em vinho OU AS "BÊBADAS" como disse, o nosso querido professor, não se fazia. Na casa dos meus pais, quando era no inverno e quando a minha mãe acabava de cozer o pão fazia-se as tais sopas de cavalo cansado, ou a tiborna, que era bocados de pão quente e bastante açúcar, embebidos em vinho tinto.
Um grande abraço, para todos vós e desejo-vos um bom ano
Mariana
E eu a pensar...que só no Minho é que éramos doidos por vinho...Na minha região, que me lembre, as bêbadas, chamem-se assim ou sopas de cavalo cansado, só se faziam pelo Natal e Ano Novo, e não durante o inverno (Mariana)...e nunca ao lanche (Lourdes)!
EliminarNão haverá mal nenhum a que se lhes chame também tibornas, mas estas são, tradicionalmente, pão quente embebido em azeite, novo de preferência. Já agora, rabanadas são, para mim, as tais embebidas em vinho e fritas depois...Fatias douradas, essas sim, em leite, conheci-as aos 25 anos cá por baixo (ou cima?). Fatias paridas...só conheci (o nome) a partir do comentário da Alexandrina...
E assim estamos entrando um pouco nos costumes, natalícios e não só, de há 60 anos em Portugal (continental, faltam as Ilhas...).
José Auzendo
ResponderEliminarCaro professor Auzendo, nunca ouviu dizer ”Cada roca com seu fuso cada terra com seu uso.” Na região centro, também se chamava tiborna a broa quente com açúcar e vinho. Eu também me lembro de se por azeite e açúcar no pão quente. Na casa dos meus pais comíamos esta guloseima quando a minha mãe fazia o pão. Quando o pão era tirado do forno e ainda estava quente, era partido aos bocados para uma tijela e punha-se vinho tinto e açúcar. As sopas de cavalo cansado talvez fossem com o pão frio, mas na minha casa não era assim que se fazia. O motivo por falar no Inverno era porque no Verão não apetecia muito comer pão quente.
Esclarecido este assunto?
MARIANA